- "A ideia é ressignificar o nome de uma avenida tão importante", diz Kim Guerra
Foi após um almoço em família que o estudante Kim Guerra, 19 anos, teve a ideia que virou projeto de lei em tramitação na Câmara de Salvador: alterar o nome da avenida Adhemar de Barros, localizada em Ondina, para avenida Milton Santos.
"Eu perguntei para o meu pai, Enéas Guerra, quem foi Adhemar de Barros. Ele começou a me explicar sobre a biografia dele, inclusive a fama de corrupto", relata Kim.
Ao saber detalhes da história de vida de Adhemar, o estudante do bacharelado interdisciplinar de arte da Universidade Federal da Bahia (Ufba) lançou, via internet, uma petição propondo mudar o nome da avenida.
Incomoda Kim o fato de o endereço de um dos principais campus da Ufba ter o nome de um político tão polêmico e que, até onde se sabe, não teve ligações tão fortes com a Bahia a ponto de justificar a homenagem.
Além disso, no campus fica o Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos (Ihac).
Ex-governador e ex-prefeito de São Paulo, Adhemar de Barros (1901-1969) teve o nome envolvido em diversas denúncias de corrupção, inclusive ficou conhecido como "o político que rouba, mas faz".
Já o baiano Milton Santos foi um dos grandes intelectuais da área de ciências humanas e escreveu textos que revolucionaram os estudos de geografia.
Rede - A petição online recolheu cerca de 900 assinaturas. Kim Guerra também criou camisetas defendendo a mudança de nome, blog e um perfil no Facebook.
Rede - A petição online recolheu cerca de 900 assinaturas. Kim Guerra também criou camisetas defendendo a mudança de nome, blog e um perfil no Facebook.
O movimento começou em 2012 e levou o vereador Gilmar Santiago (PT) a apresentar um projeto de lei para mudar o nome da avenida.
"Salvador tem ruas com nomes de pessoas que não possuem nenhuma relação com a Bahia. No caso dessa avenida, é mais complicado ainda", diz o vereador.
"Salvador tem ruas com nomes de pessoas que não possuem nenhuma relação com a Bahia. No caso dessa avenida, é mais complicado ainda", diz o vereador.
Para ele, a mudança para Milton Santos será uma justa homenagem ao intelectual baiano. "Ele é referência quando se fala em globalização e geografia, pensada como uma ciência que também inclui o humano", diz.
O vereador confia que vai encontrar apoio entre os colegas para fazer o projeto ser aprovado.
"O projeto está na Comissão de Constituição e Justiça. Espero que todos os vereadores percebam a importância dessa mudança", completa.
Com o apoio do vereador Waldir Pires (PT), que integra a comissão, ele já pode contar: "Acho uma iniciativa brilhante e tem todo o meu apoio. Fui contemporâneo de Milton na Faculdade de Direito".
Waldir, inclusive, está dando entrada em um projeto de lei que proíbe a adoção em locais públicos de nome de pessoas que tenham violado direitos humanos ou desviado dinheiro público.
O arquiteto e historiador Francisco Senna afirma que fica com o pé atrás quando o assunto é substituição de nomes de locais públicos. Mas, neste caso, considera que há uma causa justa. "É óbvio que Milton Santos possui bem mais relevância para homenagear uma das principais avenidas da cidade do que Adhemar de Barros".
Senna destaca a única homenagem que conhece a Milton Santos em espaço público na capital baiana: uma escola municipal em Mata Escura. "Esta escola foi construída na administração de Antônio Imbassahy", relata.
Senna diz, ainda, que não tem informações sobre os motivos da homenagem ao ex-governador paulista. "Já busquei esta informação e não encontrei, inclusive recentemente, quando estava escrevendo um texto sobre a região de Barra e Ondina".
Milton Santos deu novo foco ao estudo da geografia
Milton Santos nasceu em Brotas de Macaúbas (a 600 km de Salvador) e mudou-se para a capital ainda criança. Durante dez anos (1954-1964), integrou o quadro de jornalistas de A TARDE.
Graduado em direito pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), fez doutorado em geografia na Universidade de Strasbourg, na França, em 1958.
Professor da Universidade Católica do Salvador (Ucsal) e da Ufba, Milton Santos deixou o Brasil em 1964 devido ao golpe militar.
Nesse período, começou a carreira internacional de dedicação ao magistério. Foi professor convidado nas universidades de Toulouse, Bordeaux, Sorbonne, Massachusetts Institute of Technology (MIT), dentre outras.
Clássico - De volta ao Brasil, em 1977 ensinou na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e na Universidade de São Paulo (USP), de onde foi professor titular até a aposentadoria.
Seu livro Por Uma Geografia Nova – Da crítica da geografia a uma geografia crítica tornou-se um clássico.
Cleidiana Ramos
Fonte:http://atarde.uol.com.br